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Reportagem Publication logo Julho 14, 2023

Sementes para o Amanhã: Roça Estadual da Juventude Trabalha com Sementes Nativas e Instiga Jovens Indígenas a Preservarem Tradições

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Na região da Serra da Lua, em Roraima, as comunidades indígenas abraçam a sua ancestralidade na...

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Jovens trabalhando na roça estadual da juventude. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

Um Só Planeta foi até Roraima conversar com moradores da Terra Indígena Raposa Serra do Sol sobre benefícios e desafios de projeto agroflorestal administrado por lideranças jovens da região


Vindos de todos os lados, sons de enxada ocupam o ambiente. Em cada canto da roça, jovens trabalham em uma produção diferente. Mesmo à primeira vista, é perceptível a existência de um sistema bem definido. Aqui são plantadas as pimenteiras. Logo ao lado, o bananal. Mais à frente, já começam a crescer as batatas-doces. A poucos metros, as linhas onde a terra está preparada para receber o manival. Aos fundos, uma horta e um viveiro de mudas.

“Para nós, esse trabalho é comunitário e todo mundo tem uma função específica” explica Paulo Ricardo, do povo Macuxi, coordenador regional da juventude na Região Raposa. “Cada um tem sua responsabilidade e seu objetivo para cumprir no final do dia”, acrescenta.


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Antes de adentrar a roça estadual da juventude, Paulo pede que energias e sentimentos negativos sejam deixados para trás. Às margens do sagrado Lago Caracaranã, o centro regional de mesmo nome que aloja a roça exige um respeito especial.


Paulo Ricardo, coordenador regional da juventude. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

Localizado na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, que foi homologada em 2005, o Centro Regional Caracaranã é frequentemente palco de oficinas e assembleias, como a 52ª Assembleia Geral dos Povos Indígenas de Roraima, que ocorreu em março de 2023 e contou com a presença do presidente Lula.

A ideia de se criar a roça estadual da juventude surgiu no ano passado, a partir de uma demanda coletiva das coordenações jovens das nove regiões de atuação do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Depois de uma primeira tentativa no Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol, que não foi adiante por dificuldades logísticas, as lideranças jovens reafirmaram seu compromisso em janeiro deste ano, agora no Centro Regional Caracaranã.


Raquel Wapichana, coordenadora estadual da juventude. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

Dentro do movimento indígena, a sustentabilidade é um tema especialmente caro à juventude. “Em nossas assembleias, nós sempre fazemos reflexões em relação à sustentabilidade. Mas também precisamos colocar isso em prática”, explica Raquel Wapichana, coordenadora estadual da juventude. “Esse trabalho coletivo no Centro Caracaranã foi uma das nossas primeiras práticas a nível estadual”, acrescenta.

O espaço e reconhecimento dado ao papel de liderança dos jovens representa uma mudança de paradigma relativamente recente dentro do movimento indígena de Roraima. Uma mudança que, a princípio, encontrou obstáculos em lideranças tradicionais. Valério Eurico da Silva, do povo Macuxi, coordenador do Centro Regional Caracaranã, foi uma exceção.


Roça estadual da juventude. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

Desde o princípio, Valério acreditou no potencial da juventude e se prontificou a oferecer todo o suporte necessário ao desenvolvimento das suas iniciativas.

“O que eu estou fazendo aqui é dar apoio. Não só de trabalho na roça, mas de alimento para eles trabalharem, gás, transporte. Eu gosto muito do trabalho deles aqui”, diz. Para Valério, é importante repassar para os jovens o cuidado com o cultivo. “A gente morre pelo próprio alimento que compra.”

Ele espera que, daqui pra frente, os jovens indígenas possam levar uma vida cada vez melhor – e que continuem convidando cada vez mais pessoas para se juntarem não só a esse projeto, como a outros que venham a surgir.

Sweet potato plants growing.
Plantas de batata doce crescendo. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

Mas, para Jefferson Fernandes do Nascimento, do povo Macuxi, professor de agronomia e ex-reitor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), as roças tradicionais indígenas têm grandes desafios pela frente. “A região onde está o Lago Caracaranã está passando por um processo de expansão do agronegócio, especialmente com lavouras de soja e milho”, ele explica.

O professor acrescenta que, em breve, comunidades próximas a essas grandes lavouras irão começar a sofrer os impactos de alterações ambientais, como o excesso de pragas – algo que já viu acontecer na Região Surumu, também pertencente à TI Raposa Serra do Sol.

“É preciso que tenhamos políticas públicas que respeitem os processos antropológicos e a cultura ancestral dessas regiões, para garantir a preservação do patrimônio que são as roças tradicionais”, Jefferson defende.

Hoje, as sementes no plantio da roça da juventude foram doadas por Amarildo Mota, o antigo coordenador do Centro Willimon. Também localizado dentro da TI Raposa Serra do Sol, desde 2019 o centro tem desenvolvido um banco de sementes tradicionais.

“A gente vem resistindo com essas sementes, que foram as mesmas que nossos antepassados trabalharam”, conta Paulo Ricardo. “Elas chegaram a quase desaparecer. Então, no momento, o objetivo da nossa produção não é o consumo, mas sim multiplicar e fortalecer essas sementes para que, no futuro, a gente possa ter segurança de continuar trabalhando com elas.”

Maize seeds donated by the Willimon center.
Sementes de milho doadas pelo centro Willimon. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

Mas por mais que a juventude tenha muita força física, entusiasmo e disponibilidade, muitas vezes falta conhecimento. Seja aquele tradicional, dos antepassados, seja o conhecimento técnico para uma boa produção.

“Então, quando a gente pensou em trabalhar com a roça, nós buscamos orientações”, conta Paulo. “A gente tem as orientações dos agrônomos formados no Centro Indígena de Formação e Cultura e também aquelas das nossas lideranças, dos nossos anciãos, dos nossos pajés.”

Observando o trabalho dos jovens, Valério acredita que a colheita por vir será farta. O inverno, ele diz, está fraco: a chuva este ano não será tanta a ponto de atrapalhar a lavoura. Basta ouvir os pássaros. “Quando passarinho canta, o inverno vai ser fraco”, ele diz. “A gente aprendeu assim com os velhos. Aqui, a gente não trabalha com a meteorologia dos brancos.”

Mesmo com tão pouco tempo de existência, a roça estadual já sente o efeito das mudanças climáticas. Mas a juventude indígena de Roraima não perde tempo na busca por soluções. Com a chegada da época de chuvas e da temporada de plantio, o cuidado com as pragas é redobrado, com coleta e análise diárias de dados coletados sobre o que acontece nas plantações. Além disso, a roça possui um viveiro onde são preparadas mudas que estejam mais adaptadas ao clima e ao solo.

Hoje, o compromisso da juventude é com a gestão de seu território e sua sustentabilidade. Para Paulo Ricardo, esse é um auto-desafio enquanto jovem e enquanto liderança. “É uma forma de mostrar para nós mesmos e para o mundo que é possível sonhar e trabalhar para que esse sonho se torne realidade”, diz.

Valério shows where the maniva that will be planted to grow cassava is sprouting.
Valério mostra onde está brotando a maniva que vai ser plantada para crescer a mandioca. Imagem por Amanda Magnani. Brasil, 2023.

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